Hoje acordei com espírito fraternal e solidário. Não ria, tenho dias assim, não sou de todo mau.
Então,
tomado por uma aura angelical cedi o carro para o Enzo. Ele passaria o dia na
cidade e precisava realizar alguns contatos, encontrar-se com o comando da ONG
e finalmente ir buscar o Luiz no aeroporto. De minha parte teria um dia cheio e preso no
LAB, fui acordado com a notícia de mais um encalhe de Jubarte, iria acompanhar
o resgate. E portanto não faria mesmo uso do automóvel. Evidentemente que estava
cheio receios, não minto. Se fosse católico teria rezado um rosário! Passei os meus números de telefone, o
cartão da seguradora, as chaves e o vi afastar-se. Meu coração apertou. Que seria do carro?
As notícias vindas desde a base de Areia Branca, onde a
baleia encalhara, não eram das melhores. Outra hora eu detalho o que se passou no
litoral norte. Ocorreu que tive de me deslocar, contrariando as minhas
expectativas e tive de tomar o serviço vergonhoso de ônibus da cidade.
Andar de ônibus é uma aventura social, me disseram... ou li.
Não importa.
O fato é que eu tomei o famigerado 057 junto à estação do
Relógio do Sol e é por isso que decido registrar duas situações muito
interessantes ocorridas nessa viagem de horrores.
Entrei, paguei, sentei e abri uma revista. Seguem-me duas gurias, na casa dos vinte anos, sentam uma posição a minha frente, falam alto devido ao barulho do ônibus (que nem era tanto, motor externo. Presumo tratar-se de mais uma mania local: berrar) tinham um sotaque carregado e agudo, capaz de fazer o Beethoven desejar a surdez! Uma delas queixava-se do amante e conta, em um tom mais baixo, mas não o tanto quanto seria necessário, o que se passou. A outra exalta-se e diz: "Você tem sangue de barata?! Se imponha, o homem não pode chegar assim e créu! Direitos iguais, greve nele, minha filha!”
Eu ri. Não me contive. Não foi um riso alto, nem uma
gargalhada, mas o maldito do 057 acabara de parar no Estação dos Hospitais. De
imediato elas se deram conta e voltaram-se como nadadoras de nado sincronizado
em minha direção. Enfiei a cara na revista para ouvir da sindicalista: “Que nojento! Escutando a nossa conversa!!”. Levantaram-se e
seguiram para o fundo do ônibus de onde não mais as ouvia.
O onibus segue e para na Estação Metropolitana. Ergo a vista
e me assusto, parecia estouro de boiada, ainda me pergunto porque não se faz uma
estúpida fila nesses lados dos trópicos... Atropelos,
afobações e as clássicas frases: "Ó faizôfavor, chegue mais para trás". "'Tá
com pressa? Passa por cima". "Ai meu pé, merda!" "Não empurrem, não empurrem, cabe todo
mundo". "Com licença, com licença, com licença".
Passado o furacão todos se acomodam, é quando percebo uma
voz infantil ao meu lado: “Olha só mãe, dois negão” Dizia um piá com pouco mais de
seis anos, com o dedo em direção a dois rapazes, provavelmente angolanos ou guineenses.
A mãe o repreende e me olha sem graça. “Esse
menino me mata de vergonha” Diz virando o rosto da criança em direção oposta
aos dois rapazes. Não demorou muito e o piá se transforma em uma metralhadora. “Mãe
olha o Fusca Velho!” “Mãe olha a gorda!” “Mãe olha aquele homem feio!” “Mãe eu
vi um ceguinho!”. A mãe só falava pára, seguido de beliscões, puxões de cabelos e
ameaças. Nunca vi criança tão politicamente incorreta!
Foi quando ele olhou para mim. Congelei!
“Mãe, olha!!” Me apontou o danado do dedo
e ameaçou aproximar-se, num instinto de preservação dei uma visível recuada,
foi quando a mãe segurou o pequeno Demônio da Tasmânia. Ele então, cochichou em seu ouvido. Coloquei-me em posição
de alerta máximo. Como não parava de me olhar, decidi fazer o mesmo e olhei-o por um tempo bem serio e acabei sorrindo, quem sabe ele mudaria de foco. Voltei à revista. De rabo de olho
monitorava os passos do pequeno que não parava de me fitar. Ele estica o
pescoço e dispara: “O que é isso?” O dedo estava me ameaçando. Fiz-me de morto,
virei a página. “Mãe olha o chapeuzinho dele!” Acho que até quem estava na
traseira do ônibus olhou, tamanho foi o berro do piá! “Posso ver?” E antes que
eu respondesse... “Mãe eu quero um desse! Deixa eu ver!” Disse puxando o meu
braço (Esse ver no dialeto local é igual a pegar, é uma mistura de visão e tato.
Hábito terrível e incorporado ao viver local). Olhei para mãe com um não na cara. E para a minha
surpresa ela diz: “Deixa ele ver só um pouquinho” Não adiantaria explicar que
nem um tornado tiraria aquela kipah da minha cabeça, então disse: “Sinto muito
senhora, não posso.” E o choro começou, seguido de pernadas e mais puxões de
cabelo e ameaças de morte.
Lancei um olhar na direção dos rapazes, um fazia
sinal de negativo, o outro sorriu. A mãe indignada com a minha falta de
humanidade, pediu para trocar de lugar com um senhor, que atendeu. Ao longe
ainda ouvi seus reclames de falta de compreensão e simpatia.
E a viagem continuou, desci na Estação do Portugal Center e
a primeira visão que tive foi de uma vitrine de informática. E pensei como
seria útil a tecla delete para determinados tipos de mães.
Fotos - HK Bus
4 comentários:
Tenso hein.
Hahahahah divertido, foi ao final, Gus.
Que aperto hein hahahahaha!!!
É. Foi uma doideira Mike. Hahaaha
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